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Marta Watanabe, de São Paulo
"Você é hippie?" "Você vende coisa na rua ou na feira?" Viviani Cazarotti cansou de ouvir essas perguntas quando dizia a alguém que era artesã. Hoje, quando perguntam sua profissão, ela diz sem medo que tem uma pequena empresa produtora de artigos para decoração de quartos de bebê, desde a pintura de parede até o kit de berço.
Os atuais produtos de Viviani continuam a ser fabricados a mão no ateliê montado no quintal de sua casa, da mesma forma que as almofadas e lençóis que personaliza há praticamente cinco anos. Agora, porém, ela pode planejar aumento de produção e a contratação de um ajudante, algo inimaginável antes.
"Agora eu tenho um CNPJ", resume a artesã, referindo-se ao número do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, concedido a toda empresa formalmente aberta. Viviani foi uma das 126 mil pessoas que conseguiram CNPJ por meio do Empreendedor Individual, programa do governo federal lançado em julho, que permite o registro regular, a custo baixo, dos profissionais que faturam até R$ 36 mil anualmente.
Com o CNPJ, Viviani emite nota fiscal e tornou-se segurada da Previdência Social. Ela consegue isso pagando R$ 51,15 ao mês de contribuição previdenciária e mais R$ 1 relativo ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para as atividades de comércio e indústria. Antes, explica, estava na informalidade. A vontade de se regularizar já havia surgido antes, mas era inviável, mesmo pelo Simples, sistema de tributação desenhado especialmente para as micro e pequenas empresas. "Eu teria de pagar entre R$ 400 e R$ 500 ao mês, o que ficaria difícil porque há muita sazonalidade e em alguns meses eu não tiro tanto."
Seja pelo programa Empreendedor Individual ou não, a formalização de pequenos produtores e prestadores de serviços é um dos itens que, segundo os especialistas, tiveram papel importante na elevação da arrecadação da contribuição previdenciária recolhida pelos chamados contribuintes individuais. Amir Khair, especialista em contas públicas, diz que o recolhimento total desse segmento está, claro, muito longe de alcançar o das empresas, mas tem apresentado uma evolução que salta aos olhos. Atualmente o recolhimento dos individuais é de 3,4% do total arrecadado pela Previdência Social.
Para Khair, além dos incentivos à formalização dos profissionais que trabalham "por conta própria", há também um grande crescimento do setor de serviços, o que leva, paralelamente, a uma demanda maior pela contratação de autônomos e profissionais liberais. A contribuição recolhida pelas empresas por serviços prestados a elas também experimentou aumento maior que o do total. A participação dessa contribuição aumentou de 8,91% em dezembro de 2008 para 9,37% em novembro de 2009.
No acumulado de janeiro a novembro, a contribuição arrecadada pelos individuais já supera em termos nominais o total recolhido em todo o ano de 2008. Esse segmento apresentou elevação de 11,62% no recolhimento à Previdência, desempenho superior aos 8,96% da arrecadação total ao INSS no acumulado até novembro de 2009. Nesse período, o valor pago pelos contribuintes individuais foi de R$ 5,78 bilhões. No mesmo período do ano anterior, foram R$ 5,18 bilhões.
Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, estima-se que no Estado de São Paulo foram formalizados pelo Empreendedor Individual cerca de 45 mil pessoas que trabalhavam de forma autônoma e sem nenhuma contribuição à seguridade social. A expectativa é que até o fim de 2010 sejam formalizados 1 milhão de empreendedores em todo o país. Se a meta for cumprida, o recolhimento dos contribuintes individuais ao INSS deve aumentar 10%.
Para o secretário de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Edson Lupatini Júnior, as adesões podem superar a meta. "O número de acessos registrados até agora foi de 3 milhões de pessoas", diz. O número total de profissionais na informalidade no país é estimado em 11 milhões.
Segundo o diretor-superintendente do Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae-SP), Ricardo Tortorella, o programa é um sucesso. O número de pessoas formalizadas, disponível desde julho, superou as expectativas. "Levando em conta a falta de informações e divulgação e também os problemas operacionais do início do programa, houve grande interesse", diz. "Há sempre um medo de se formalizar, mas descobrimos que esse receio é menor do que se imaginava." De julho a novembro o Sebrae registrou 27, 5 mil atendimentos sobre o programa
O programa permite a formalização de cerca de 170 atividades diversas, como açougueiro, alfaiate, encanador, entre outros. "O escopo de profissões é amplo e permite a entrada de todas as profissões. As restrições são poucas." O empreendedor não pode, por exemplo, ser sócio de uma empresa e os profissionais liberais não estão incluídos. "Tudo é uma relação entre custo e benefício e pelas consultas que atendemos percebemos que o programa oferece regularização a um bom preço."
Os benefícios da formalização são muitos, diz a artesã Viviani. Ela conta que, atualmente, com uma conta corrente em nome de pessoa jurídica, ela consegue comprar matéria-prima em condições melhores. Antes, como pessoa física, ela não tinha crédito e tinha de pagar antes para receber as mercadorias. "Para receber dos clientes, também posso emitir boletos para cobrança bancária. Meu fluxo de caixa melhorou porque agora as minhas despesas pessoais estão em uma conta separada da conta da empresa", explica.
Ter um CNPJ propiciou também novas possibilidades para desova de produtos, diz ela. "Antes eu só podia deixar mercadorias
O Empreendedor Individual permite o registro de até um trabalhador, com baixo custo. Se contratar alguém, Viviani pagará 3% do salário mínimo para a Previdência Social e 8% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) mensalmente. O empregado recolhe 8% do salário para a Previdência.
O serralheiro Edson Lima também ampliou seus planos de atuação depois de se tornar um empreendedor também no papel. Especializado em manutenção de portas de rolagem, Lima se formalizou depois de 20 anos na área. "Já tinha pensado nisso, mas era muito caro abrir uma empresa." Agora, diz, trabalha mais tranquilo. "A gente contribui para o INSS e sabe que tem mais garantias", observa.
O CNPJ, contudo, não faz diferença apenas para uma aposentadoria ou para algum benefício da Previdência. "Agora eu vou poder fazer contratos com grandes empresas." Ele diz que já foi procurado por redes varejistas para fazer a manutenção das portas de rolagem em determinas regiões, mas nunca conseguiu assinar o contrato porque não estava formalizado. "E também era difícil prestar serviços para uma empresa porque eu não tinha nota fiscal. Teve vezes em que comprei a nota de outras pessoas, mas eu acabava perdendo uma boa parte do que ganhava."
Fonte: Valor Econômico
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